quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Pedro Juan Gutiérrez - Trilogia Suja de Havana

“Desde então me incomodam muito essas duas palavras: correto e sensato. São falsas e pedantes. Servem para ocultar e mentir. Tudo é incorreto e insensato. Toda a história, toda a vida, todas as épocas foram incorretas e insensatas. Nós mesmos. Cada um de nós, por natureza, é incorreto e insensato, só que nos reprimimos para voltar para o cercado como boas ovelhas, e aplicamos rédeas e mordaças em nós mesmos.”

“Mas a carne é fraca. Pelo menos a minha é fraca e pecadora. E acho que com todo mundo acontece a mesma coisa com suas carnes, mas as pessoas não querem se dar conta e até inventaram os conceitos dedecência e indecência. Só que ninguém sabe definir onde estão as fronteiras que separam decentes de indecentes.”

“Não aguentei mais e comecei a chorar como criança. Uma mulher se aproximou, tocou meu ombro e disse: “Tem de ser forte, meu filho, você tem fé?”. Eu me virei e olhei com fúria para ela. Acho que tinha um rosário e uma Bíblia na mão.
_Que forte, porra nenhuma minha senhora! Vá à puta a pariu e me deixe em paz!”

“Definitivamente, só isso é que importa. Desejar alguma coisa. Quando você deseja alguma coisa com força, já está se encaminhando.”

“Bom, quando comecei a abandonar as “coisas importantes”, as “coisas importantes” dos outros, e a pensar e a agir um pouco mais pra mim mesmo, entrei em uma fase dura. E assim fiquei muitos anos: à margem de tudo. Me equilibrando. Sempre no precipício. Me metia em outra etapa dessa aventura que é a vida. Aos quarenta anos o sujeito ainda está em tempo de abandonar a rotina, o peso estéril e aborrecido, e começar a viver de algum outro jeito. Só que quase ninguém se atreve. É mais seguro continuar igual até o fim. Eu estava me endurecendo. Eu tinha três opções: ou me endurecia, ou ficava louco, ou me suicidava. De forma que foi fácil decidir: tinha de endurecer.”


Era noite, os calos dos meus olhos doíam de tanto ver desgraça, pedi aos céus uma boa música e instrumentos melhores para se fazer poesia, as estrelas me diziam: vá em frente, a vida, essa baboseira de tanta coisa não para, e você, só você, sabe a importância das baboseiras na tua existência. Deslize emocional, minha mente viaja para lugares onde gostaria de estar, brindando momentos inarráveis com amigos sensacionais que tive a oportunidade de conhecer por aí. A vida bate e sabemos onde nosso calo dói, sabemos onde caleja nossos problemas e onde toca a nossa mais linda canção. Então, que sejamos corajosos o suficiente para andar com sabedoria na mediocridade dos outros, sem perder a elegância e conhecimento que a curiosidade nos dá, como vive os tão felizes que nunca aproveitam a tristeza é como nunca quero viver, reflito e peço ao que é desconhecido na imensidão das coisas, que nos ofereça o melhor vento na cara. Do resto, correremos atrás.

Petherson Cardoso

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

“Bom, promiscuidades à parte, tive de continuar. Me endurecendo, claro. As pessoas achavam que eu estava madurecendo. Mas não. Só tentava ficar mais e mais duro e não permitir que me manipulassem. Cada um que se fodesse sozinho. Eu tinha que dosar muito bem o pouquinho de amor que restava dentro de mim para evitar que o tanque ficasse a zero e o motor parasse. Não perdia as esperanças de recarregar em algum lugar. Utópico de merda. Fodido, mas sonhando encontrar algo bonito dentro de mim que de novo enchesse o tanque até a boca para repetir tudo e para ser outra vez aquele sujeito generoso e bom amante. Será que você é um imbecil?, eu me perguntava às vezes. Em outras ocasiões, mais relaxado, me dizia: É, é possível.”
Pedro Juan Gutierrez, no livro Trilogia suja de Havana